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Caso Benício: Médica admite erro na prescrição de adrenalina que matou criança em Manaus

A morte de Benício Xavier de Freitas, de 6 anos, em um hospital particular de Manaus, após receber adrenalina administrada de forma incorreta, gerou ampla repercussão e abriu debate sobre protocolos de segurança em emergências pediátricas no Brasil. O caso, ocorrido entre 22 e 23 de novembro de 2025, é investigado pela Polícia Civil do Amazonas como homicídio doloso qualificado.


Cronologia do atendimento

Benício foi levado ao Hospital Santa Júlia com tosse seca e suspeita de laringite, após dois episódios de febre. Segundo a família, a médica Juliana Brasil Santos prescreveu lavagem nasal, soro, xarope e três doses de adrenalina intravenosa de 3 ml a cada 30 minutos. A aplicação foi realizada por uma técnica de enfermagem de plantão, que afirmou ter apenas seguido a prescrição, apesar de nunca ter administrado adrenalina por via endovenosa antes.

Após a primeira dose, a criança apresentou taquicardia, palidez, membros arroxeados e queda de saturação de oxigênio para cerca de 75%. Benício foi levado à sala vermelha e, posteriormente, intubado na UTI, onde sofreu seis paradas cardíacas consecutivas, a última delas fatal, às 2h55 do dia 23 de novembro.


Depoimentos de profissionais de saúde

Nos últimos dias, a Polícia Civil do Amazonas ouviu médicos e enfermeiros envolvidos no atendimento:

  • O médico Enryko Garcia de Carvalho Queiroz, coordenador do pronto atendimento pediátrico, confirmou troca de mensagens com Juliana Brasil e disse ter orientado a monitorar os batimentos cardíacos de Benício durante o atendimento.
  • O enfermeiro Tairo Neves Maciel, supervisor dos técnicos de enfermagem, confirmou que a técnica ficou sozinha no atendimento da criança, contrariando a versão da médica.
  • Outros profissionais da UTI pediátrica, incluindo três enfermeiros, e os pais da criança também prestaram depoimento para esclarecer a sequência de eventos.

Uma acareação entre a médica e a técnica de enfermagem está prevista para confrontar versões divergentes, enquanto a polícia deve ouvir ainda outros profissionais que participaram do atendimento.


Reconhecimento do erro e investigação ética

Em relatório enviado à Polícia Civil, Juliana Brasil Santos admitiu ter prescrito a adrenalina na via errada, informando que a medicação deveria ser administrada por via inalatória. Ela afirmou ter se surpreendido com a ausência de questionamentos por parte da equipe de enfermagem.

O Hospital Santa Júlia afastou tanto a médica quanto a técnica de enfermagem durante a investigação. O Conselho Regional de Medicina do Amazonas (CREMAM) instaurou um processo ético sigiloso para avaliar a conduta profissional.


Uso correto da adrenalina e segurança em emergências

Especialistas em medicina de emergência explicam que a adrenalina intravenosa deve ser usada apenas em situações graves, como parada cardiorrespiratória ou choque refratário. Outras formas de administração, como inalatória, intramuscular ou subcutânea, são indicadas em crises respiratórias graves ou anafilaxia.

A tragédia de Benício também destaca a necessidade de checagens múltiplas e protocolos rigorosos em hospitais, seguindo o modelo do queijo suíço, que prevê múltiplas barreiras de segurança para reduzir falhas humanas na administração de medicamentos.

Além disso, especialistas reforçam a importância da presença de médicos emergencistas em emergências pediátricas. Atualmente, o Brasil conta com apenas cerca de 1.200 emergencistas, frente a 500 mil médicos, e muitos hospitais dependem de profissionais recém-formados em situações críticas.


Próximos passos da investigação

O delegado Marcelo Martins, responsável pelo caso, afirmou que os depoimentos buscam esclarecer a dinâmica do atendimento, incluindo o estado de saúde de Benício na chegada à UTI e as medidas adotadas durante o atendimento. A investigação continuará reunindo depoimentos e analisando prontuários para compor o relatório final.

Embora tenha solicitado a prisão preventiva da médica, a Justiça negou o pedido, considerando que não há, até o momento, fundamentos suficientes. Juliana Brasil Santos segue respondendo ao processo em liberdade.