A Câmara dos Deputados decidiu, nesta quarta-feira (10), manter o mandato da deputada Carla Zambelli (PL-SP), mesmo após a parlamentar ter sido condenada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) a 10 anos de prisão por envolvimento na invasão dos sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O placar registrou 227 votos pela cassação, 170 contrários e 10 abstenções. Para a perda do mandato, eram necessários 257 votos.

A decisão abriu um novo capítulo na disputa institucional entre o Legislativo e o Judiciário e reacendeu o debate sobre interpretação constitucional nos casos de condenação criminal definitiva envolvendo parlamentares.
Por que a cassação foi rejeitada pela Câmara?
A condenação de Zambelli pelo STF determinava a perda automática do mandato, já que a pena de reclusão em regime fechado impediria a deputada de cumprir suas obrigações parlamentares, ultrapassando o limite constitucional de faltas.
Mesmo assim, os deputados entenderam que a cassação precisava ser analisada pelo plenário, aplicando o procedimento reservado aos casos de condenação penal transitada em julgado, que exige votação e maioria absoluta.
A postura contraria a tese adotada pela Primeira Turma do STF, que considera a cassação automática nesses casos. Essa divergência deve levar o tema novamente ao Supremo.
O caso que levou à condenação da parlamentar
Carla Zambelli foi alvo de dois processos no STF:
1. Invasão ao sistema do CNJ — pena de 10 anos
A deputada foi condenada por atuar, segundo decisão judicial, em conjunto com o hacker Walter Delgatti Neto para inserir documentos falsos na base do CNJ, entre eles um suposto mandado de prisão contra um ministro da Corte. A ação foi vista como tentativa de descredibilizar o sistema de Justiça.
2. Perseguição armada em 2022 — pena de 5 anos e 3 meses
Em outro processo, Zambelli foi condenada por perseguir, armada, um apoiador do então candidato Lula às vésperas do segundo turno das eleições de 2022.
Com as duas sentenças definitivas, a deputada teve direitos políticos suspensos e está presa na Itália, onde aguarda a análise do pedido de extradição encaminhado pelo governo brasileiro.
Votação reacende embate entre Câmara e STF
A decisão do plenário abre um impasse jurídico. A Câmara optou por analisar a cassação, enquanto o STF considera que a perda de mandato deveria ocorrer de forma automática.
Parlamentares já anunciaram que irão ao Supremo para questionar o procedimento adotado, o que deve reacender discussões semelhantes às que ocorreram no caso do ex-deputado Natan Donadon, em 2013. Na época, a Câmara também preservou o mandato mesmo após condenação criminal, e o tema acabou sendo revertido no Judiciário.
O que diz a Constituição sobre perda de mandato
A Constituição prevê duas situações distintas:
1. Perda automática de mandato
Ocorre quando o parlamentar ultrapassa um terço de faltas às sessões, o que inclui condenações que resultem em prisão por tempo superior a 120 dias.
2. Perda decidida pelo plenário
Aplica-se a parlamentares condenados criminalmente com sentença definitiva, exigindo votação e maioria absoluta.
O STF entende que, como Zambelli está impedida de comparecer às sessões devido ao regime fechado, o caso se enquadra na primeira regra — perda automática.
Já a Câmara considerou que a situação se encaixa na segunda hipótese, justificando a votação.
E agora? Próximos passos do caso Zambelli
Com o impasse, especialistas preveem que o STF será provocado a analisar:
- a validade da votação na Câmara;
- se a perda do mandato deve mesmo ser automática;
- como interpretar a suspensão dos direitos políticos diante da decisão legislativa.
Enquanto isso, o processo de extradição segue em análise na justiça italiana, e Zambelli permanece detida nos arredores de Roma.




