O carnaval de rua em São Paulo deste ano terá aproximadamente 100 blocos a menos do que inicialmente planejado pela administração municipal. A divulgação dos cancelamentos foi realizada por meio de publicações no Diário Oficial desde o mês de janeiro.
A principal razão para as desistências, conforme apontado pelos blocos, é a carência de recursos e a ausência de incentivo público. As agremiações também manifestam insatisfação com a desorganização por parte da prefeitura e levantam questionamentos sobre o modelo de organização do evento para este ano.
No ano passado, a Prefeitura de São Paulo estabeleceu o prazo até 30 de dezembro para que os blocos cancelassem os desfiles antes de serem oficialmente anunciados.
A lista oficial de desfiles foi revelada no início de janeiro, com a previsão de pelo menos 579 blocos desfilarem pelas ruas da cidade ao longo dos oito dias oficiais de folia na capital.
Dentro desse total, mais de cem já anunciaram neste mês de janeiro que não têm mais condições de se apresentar neste ano. Outras 16 agremiações já haviam comunicado à prefeitura no ano passado que não participariam deste carnaval.
Segundo os registros da Secretaria das Subprefeituras fornecidos à TV Globo, até o momento em 2024, ocorreram 129 cancelamentos de desfiles, cifra inferior aos 213 cancelamentos registrados no carnaval de rua do ano anterior, em 2023.
A pasta ainda não divulgou o total de blocos que cancelaram os desfiles, considerando que um único bloco pode desfilar em vários dias diferentes de carnaval na cidade.
O que diz o Prefeito?
Durante um evento na manhã desta quinta-feira (1°), o prefeito Ricardo Nunes (MDB) diminuiu a importância das desistências dos blocos, assegurando que a Prefeitura de São Paulo está cumprindo os prazos para disponibilizar toda a infraestrutura necessária para que os blocos realizem seus desfiles pelas ruas da capital.
“Cada ano que a gente faz o carnaval de rua, ele vai ampliando e melhorando. Agora, lógico, que com um evento desse tamanho, com centenas de blocos participando, pode ter um ou outro que desista. Agora, não é a prefeitura que paga esses blocos. São blocos independentes. A prefeitura dá a infraestrutura para eles poderem fazer o seu desfile, que é muito importante para a cidade. Agora, se algum ou outro bloco desiste, é um problema dele, de uma organização dele”, disse Nunes.
“O que compete à prefeitura é fornecer toda a infraestrutura de gradil, de banheiro, de segurança, da questão logística de fechamento de ruas. Tudo isso está sendo feito e está dentro do prazo. Não existe nada diferente do que foi feito nos anos anteriores. […]A questão de dinheiro, os blocos captam diretamente os patrocínios com as empresas. O que a gente tem percebido é que algumas empresas estão optando, algumas delas, de não investir no bloco, mas investir em bares e locais. É uma decisão da empresa patrocinadora”, justificou.
Dentre os que optaram por não participar está o megabloco Domingo Ela Não Vai, que desfila em São Paulo desde 2016 e atrai grandes multidões ao som de clássicos do Axé Music brasileiro.
Alberto Pereira Junior, cofundador do bloco e representante do Blocão, revela que desde o final do ano passado estão tentando viabilizar o desfile, mas na terça-feira (30) chegaram à conclusão de que não seria viável.
“A gente lutou até ontem, mas tem uma hora que, pela nossa sanidade mental, a gente precisa desistir também. Tem hora que só a vontade não é suficiente, é preciso partir para a realidade. Voltaremos no ano que vem com mais força, estrutura, energia renovada e num novo modelo.”
“Faltam estrutura e pensamento a longo prazo para o carnaval de rua por parte do poder público. Precisa de um olhar de Estado, não de governo, para investir no carnaval de rua”, completou.
Também há casos de blocos que desfilavam por mais de um dia e decidiram cancelar parte dos cortejos, como é o caso do Jegue Elétrico, enquanto outros, como o Lua Vai e o Samby e Junior, estão atualmente em processo de tentativa para viabilizar os desfiles.
Cabe destacar que o Bloco da Preta, apesar de ter sido mencionado pela Subprefeitura da Vila Mariana como cancelado, nunca confirmou sua participação no desfile.
São esses os cancelamentos desde 01/01/2024:
- AFROPOP
- 50 tons de Pinga
- A Madonna Tá Aqui
- ALOHA PORTAL
- Amigos da Fiel Tiradentes
- Associação Recreativa e Cultural Bloco Carnavalesco Bloco da 3
- Bar Do Rafa’
- Beija-flor (Banda Timbalada)
- Berço Elétrico
- Bloco 0800 Deekapz
- BLOCO ABRA ALAS
- Bloco Agrada Gregos – (apenas desfile extra cancelado)
- Bloco Ayabass (Luedji Luna, Xênia França, Larissa Luz)
- Bloco Belas & Empreendedoras e Mel’S
- Bloco Beleza Rara
- Bloco Calçada do Samba do Jd. Almanara
- Bloco CarnaUrsos
- Bloco Carnavalesco Carnavelhas
- Bloco carnavalesco Todos na Contra Mão
- Bloco Carnavalesco Vem com o Pai
- Bloco Carnavibe Feat Ressaca
- BLOCO DA ABOLIÇÃO
- Bloco da Alegria
- Bloco da Baby
- Bloco Da Vaca
- Bloco das Minas
- Bloco Diversidade Unida
- Bloco do Amor
- Bloco do Chacrinha
- Bloco do Festival Melhor DIA
- Bloco do Fuá
- Bloco do Lelelê
- Bloco do Rock
- Bloco do Zé Pretinho
- Bloco dos Invertidos
- Bloco dos Pinheirinhos
- Bloco Dré Tarde
- Bloco E Essa Boca Aí
- Bloco Eco Campos Pholia
- Bloco Eu Quero É Frevo com Orquestra Frevo do Mundo e Convidados
- Bloco Frita Comigo
- Bloco G
- Bloco Galera da Rampa
- BLOCO GENTE FELIZ DA VANESSA DA MATA
- Bloco GoFun – Bloco Desandei
- Bloco GoFun (Solteiro Não Trai)
- Bloco infantil Vem Erê
- Bloco Jah É
- Bloco Jegue Elétrico SP
- Bloco love funk
- Bloco Lua Vai
- Bloco Magia
- Bloco Megazord
- Bloco MEL´S
- Bloco Mistura Fina
- BLOCO NA MANHA DO GATO
- Bloco Não era Amor era Cilada
- Bloco Nosso Sonho
- Bloco Orra Bello
- Bloco Reggae Night
- Bloco Revoada de Carnaval
- Bloco Siriricando
- Bloco Sovaco de Cobra
- BLOCO UNIÃO
- Bloco Vou de Táxi
- BLOCO XODÓ
- Bloquinho da Jéssica
- BNH – Bebo na Hora
- Bridge Festival
- Bunytos de Corpo
- CarnaCadoz – Reggae e Rock
- Carnafacul – O Bloco
- Coletivo Missa
- Cordão da Bola Preta
- Cores Vivas
- Domingo Ela Não Vai
- É Pequeno + Balança
- Encontro de Fanfarras
- Fanfarra do Vou de Táxi
- FANFARROES CAMALEON
- FANFARROES DO JUREA
- Felicidades Pretas – Feira Preta
- Fobicão
- Fogo & Paixão
- JBAS IÓRIO Alegrando as Ruas e Corações
- Libertas
- Mamãe, Eu Quero Beltar!
- Mamonas Assassinas, o legado
- Megabloco do Fervo – O maior da Zona Norte
- Pagode 90’S
- PATRICIA SECCHIS & BLOCO MADALENA
- Paulão do Vra e Samba Magia, o Bloco
- PERON É FESTA
- Pirikita em Chamas
- Quintal dos Prettos
- Sambão
- Samuca e a Selva
- Sonido Trópico
- Trio Sebah Vieira
- Vai Você em Dobro
- Zélia, Cássia, Rita, Carolina e Todas as Minas
- Ziriguidum – Resgate a Primeira Infância
- Bloco Malandragem
- Lady Fama Bjus Purpurinados
- Bloco do Beijo
São esses os cancelados antes do prazo final de 30/12
- Bloco Caldeirão Sem Fundo
- Bloco Caminera
- Bloco Caos Tribal
- Bloco carnavalesco tá com medo porque veio
- Bloco de Veleiros – É pequeno mas vai crescer
- Bloco do ve
- Bloco Du Zé
- Bloco Gambiarra
- Bloco Grande Família
- Bloco Klezmer do Bom Retiro
- Bloco Não To Bem 279
- Bloco Saia de Chita
- CarnaBelém SP
- House de Rua
- Itaquerendo Folia
- Toca Raulzito SP
Zé Cury, responsável pelo Fórum de Blocos do Carnaval de Rua e representante de 215 blocos da cidade, observa que o cancelamento de blocos é uma ocorrência comum no carnaval, no entanto, destaca um movimento atípico neste ano.
“Sempre tem uma queda de entre 10% e 20% do que a gente vê de inscritos em outubro e dos que realmente vão para a rua no final. O que é novo neste ano é que quem se articula normalmente para ter o seu próprio bloco ficou prejudicado pela falta de esclarecimentos da prefeitura, do próprio atraso da definição do patrocinador master. Isso tudo deixou o mercado de possíveis patrocinadores em stand-by, e muita gente não conseguiu, porque só em meio de janeiro saiu o edital de quem seria realmente o patrocinador [do carnaval] da cidade”, afirma.
Conforme explicou, o patrocinador é quem determina a distribuição dos recursos do patrocínio, o que resulta na inviabilidade de alguns blocos desfilarem nas ruas.
Thais Haliski, membro da Comissão Feminina do Carnaval de Rua de São Paulo, afirma que os cancelamentos eram previstos pelos organizadores dos blocos. “O edital de fomento tem etapas que contemplam datas que não convergem com o carnaval de 2024, ou seja, o bloco precisa de fomento para o ano de desfile, e não para receber esse valor depois. Por quê? Porque ele não tem garantia de que vai receber o dinheiro. O edital de fomento não é para todos os blocos, ou seja, o bloco pode se inscrever, aguardando ser contemplado, mas ele pode não receber, porque temos 579 blocos inscritos na cidade, e o fomento é para 100, ou seja, não é para todo mundo, a grande maioria não tem fomento da cidade.”
Ela questiona o formato atual do carnaval de rua na capital e percebe nos sucessivos cancelamentos um indício de que, sem alterações, o evento poderá perder sua força: “Somos os protagonistas do carnaval, organizamos a festa dessa parte de organização dos blocos, e a prefeitura é responsável pelo planejamento, estrutura na cidade, organização de serviços para receber uma demanda absurda de turistas, esse modelo está provado que não dá certo. O carnaval de São Paulo vai minguar e vai chegar uma hora que todo mundo vai desistir e vai voltar a ser o que São Paulo era, que todo mundo no carnaval viajava para a praia”.
Lira Alli, da liderança do Arrastão dos Blocos, também reclama da organização: “É muito complicado porque tem gente que ensaiou o ano inteiro, se preparou o ano inteiro para isso. E aí chega na hora H e tá encontrando dificuldades muito objetivas e concretas. É muita irresponsabilidade não pensar com antecedência no Carnaval. Eu acho que é bem possível que a gente neste ano tenha a maior taxa de cancelamento de blocos na cidade de São Paulo. E isso é triste porque a grande característica do carnaval de rua de São Paulo é a sua diversidade”.
Eduardo Viola, produtor do Bloco dos Ursos, diz que, quando olharam o cenário, perceberam que a decisão mais “saudável” era suspender o desfile neste ano. “E continuar na luta para buscar recursos para que, no ano seguinte, a gente consiga ter uma gestão que converse melhor com os blocos, que oriente ou que apresente também um plano.”
Jorge Minoru, do Meu Santo É Pop, conta que, mesmo tendo organizado duas festas, o bloco não conseguiu atingir o valor mínimo para o desfile. “Neste ano nenhuma marca quis patrocinar o bloco. Até pedimos para a prefeitura para fazermos um bloco parado, que o custo é menor, mas não autorizaram. Estamos tristes, com o coração apertado porque a gente sabe o quanto o bloco é importante para o carnaval de São Paulo.”
Zé Cury finaliza: “O que é chato é que o poder público se vangloriar de ter o maior carnaval do Brasil, mas as pessoas que fazem isso acontecer são os blocos, não é a prefeitura. A prefeitura só dá os serviços de estrutura, que é a parte dela. Fica a tristeza de a gente não poder colaborar para que o carnaval seja melhor e, ao contrário, sofrer represálias em relação às coisas mais tradicionais de uma festa de carnaval, como ter que parar de tocar às 18h. O reflexo é esse, é a tristeza no maior carnaval do Brasil”.
Através de comunicado, a Prefeitura de São Paulo afirmou que a Secretaria Municipal das Subprefeituras realiza reuniões frequentes com os organizadores dos blocos em todas as 32 subprefeituras desde dezembro do ano passado. Ressaltou ainda que todos os itinerários foram analisados em conjunto com a comissão especial do evento. A nota esclarece que os blocos devidamente cadastrados receberão a infraestrutura necessária para a realização dos desfiles. Contudo, até o momento da última atualização desta reportagem, a prefeitura não havia fornecido resposta em relação aos cancelamentos dos desfiles.